Fotoclube Porto-alegrense

[Artigo] O flash do desejo, por Ademir Furtado

O flash do desejo

Fotoconto, por Ademir Furtado

A noite mais escura que alma de devasso. Eu mal conseguia vislumbrar o caminho pelo meio das árvores, a vista embaçada pela chuva que despencava como um dilúvio. Só clareava com a luz instantânea de algum relâmpago. E foi justamente durante os poucos segundos de um clarão que estourou no céu que eu vi a cena: uma mulher loira, a cabeça jogada para trás, os peitos de fora, a boca escancarada numa gargalhada cheia de lascívia, como se quisesse engolir todo aquele aguaceiro que caía. Pelo que pude ver, usava um vestido preto, mas também tive a impressão que tava totalmente nua, protegia só pelas folhagens das árvores. Ou ainda, podia ser apenas efeito da escuridão.

O que me deixou nas nuvens foi que havia também um homem de chapéu e camisa branca com a boca grudada no seio direito da mulher. A imagem durou muito pouco, mas com meu olhar fotográfico, pude registrar tudo e guardar alguns detalhes. Também notei que eles não se molhavam. Eu já me sentia quase em estado líquido, de tão encharcado.

Além desse casal, havia ainda mais duas mulheres. Uma olhava para o lado de onde eu vinha, mas só com um olho, o outro escondido atrás de algo que ela segurava diante do rosto. Da outra mulher, no fundo da cena, só se via a cabeça, também loira, de perfil para mim. Olhava para um ponto que eu não consegui identificar, como se não tivesse notado a sem-vergonhice do casal. A moça com o seio enfiado na boca do sujeito, não dava sinais de se importar com o que acontecia na volta dela, de tanto que se divertia. O curioso é que não se ouvia nenhum som. O resto do ambiente não deu pra ver porque o relâmpago só iluminou as pessoas, mas eu concluí que só havia um homem ali com as três mulheres. E eu ali, perdido naquela chuvarada, numa escuridão sem fim, na esperança de um novo relâmpago para poder ver mais. É claro que eu queria me aproximar, afinal, três mulheres para um homem só é injusto com os outros que ficam na mão, se debatem perdidos em lugar desconhecido. Porque a verdade é que eu não sabia onde tava, nem como fui parar naquela trilha no meio do mato.

Aí eu já tava tinindo. Quer dizer, não consegui mais evitar o desespero da excitação, o troço tomou conta de mim, achei que ia explodir, um desejo enorme de me meter no meio daquele trio, quer dizer, daquela dupla, me atirar pra cima das outras duas mulheres, porque aquela da gargalhada só queria o cara do chapéu. Minha ideia era: quando desse outro relâmpago, eu me jogava na direção delas. Eu já estava naquela situação que todo mundo pode imaginar. Foi quando ouvi um barulho bem perto de mim, me joguei pro lado de onde vinha o barulho, e senti um baque na nuca. Eu tinha dado com a cabeça no criado mudo na beira da cama. Acendi a luz, o meu livro de fotografias aberto no chão, na página com a foto do Guy Le Querrec que eu estava analisando. Com aquela ardência na bexiga, corri para o banheiro.

 

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